quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Mateus 7: (1-5)

Que me permita acrescentar, o filósofo alemão, Martin Heidegger – que certa vez disse: “Somos seres para a morte” – a essa frase, as seguintes palavras: “passando pela incoerência”. Então, é isso caro leitor: somos seres não só para a morte, mas também para colocar em prática a nossa incoerência.
Por isso, não me surpreende que o maior homem que já pisou neste planeta, Jesus Cristo, tenha, insistentemente, falado neste assunto. No capítulo 7 do evangelho de Mateus, os primeiros versículos abordam exatamente isso: “Por que reparas no argueiro que está na vista do teu irmão, e não vês a trave que está na tua vista? Como ousas dizer ao teu irmão: ‘deixa-me tirar o argueiro de tua vista’, tendo tu uma trave na tua? Hipócrita, tira primeiro a trave da tua vista e, então, verás melhor para tirar o argueiro da vista do teu irmão”.
Pois bem! Feito o diagnóstico, cabe-nos agora, encontrar as causas dessa doença – a incoerência – pois só assim, poderemos estabelecer o tratamento adequado. Seria a incoerência, originada pelas circunstâncias? Sim! Não vamos esquecer o que disse o grande escritor, filósofo espanhol, Ortega y Gasset: “Eu sou eu e as minhas circunstâncias”. E a circunstância, a ocasião, faz o ladrão (o PT sabe muito bem isso que estou falando...). A circunstância faz também o covarde, que num dia tem um discurso exaltado, revoltado, áspero, mas quando está na frente de quem ele se exaltou e se revoltou, muda o tom: fala manso e o que é pior: até defende, com unhas e dentes, o seu antigo desafeto...
Esse tipo de comportamento ocorre em todas as profissões, mas duvido que seja mais comum do que no meio médico. Afinal, se hoje, estamos sofrendo todas essas mazelas – baixos salários, condições subumanas de trabalho, etc. etc. – é porque os nossos pretensos “líderes” da classe médica, um dia, quando ainda não estavam na cadeira do poder, tinham um discurso aguerrido, bravo e duro contra os poderosos, mas, quando se torna um deles – um poderoso (de pés de barro, é bem verdade) – mudam o discurso, o conteúdo e o seu tom... Quando eu sou médico, apenas médico, eu critico, mas quando estou diretor de hospital, vereador, deputado, secretário de saúde, etc. etc. aí eu me transfor mo... e haja incoerência incoerente!
E essa incoerência incoerente é terrível, pois - diferentemente da incoerência defendida por Osho, o mestre budista, que certa vez disse: “Se você realmente quer desfrutar a vida em toda a sua riqueza, tem que aprender a ser incoerente, a ser coerentemente incoerente”-, ela, a incoerência não coerente, é aquela que permite que milhares de pessoas sejam mortas nos corredores dos nossos hospitais públicos, porque eu não tenho a coragem de continuar coerentemente coerente com o meu discurso que tinha antes de ocupar a cadeira do poder...
Então, caro leitor, já temos duas causas para a mudança tão rápida, extremante abrupta, do nosso comportamento: a circunstância e a cadeira do poder. Porém, há outra causa muito mais forte, explicada pela física quântica: toda vez que inspiramos, colocamos para o interior do nosso organismo um trilhão de átomos que um dia podem ter sido também respirados por Cristo, Madre Tereza de Calcutá, Gandhi, Hitler, Saddam Hussein... e o danado é que me parece que os átomos desses dois últimos têm sido responsáveis pelo ar- mau cheiroso, e bote fétido nisso - que estamos respirando na saúde do nosso estado...
Portanto, meu caro amigo, você que tem me acusado, constantemente, de incoerente, veja que a origem desse problema pode está em você mesmo, afinal não tenho cadeira do poder, nem pretendo “criar” circunstâncias para ocupá-la. Portanto, só resta-nos acusar os átomos que estou respirando, quando estou perto de você... mas, não se preocupe, como cirurgião, será fácil resolver esse problema: usarei sempre a máscara cirúrgica, quando lhe encontrar, certo?


Francisco Edilson Leite Pinto Junior (edilsonpinto@uol.com.br)
Professor, médico e escritor

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