Era uma vez uma caverna, onde os médicos viviam aprisionados, presos pelas mãos e pelos pés uns aos outros, numa prática que, posteriormente, evoluiu para o corporativismo.
Os médicos não podiam escapar daqueles grilhões que os seguravam, permanecendo naquela caverna desde o momento em que entraram na universidade até o final das suas vidas.
Viviam entretidos por “imagens distorcidas”, “sombras” que eram passadas nas paredes, primeiro por seus professores da universidade; depois, pelas revistas “científicas” e pelos congressos financiados pelas indústrias farmacêuticas. Aprendiam, com elas, o diagnóstico e o tratamento das doenças; mas somente das mais raras, com prevalência de no máximo 1 em 100.000 habitantes, as mais comuns são coisa pra enfermagem...
Como passaram toda a vida presos aos grilhões da caverna, pra esses médicos, medicina é, pura e simplesmente, diagnóstico e tratamento; qualquer outra coisa além disso não é mais medicina. E nem adianta discutir! Suas pupilas entraram numa espécie de “midríase crônica”, tornando doloroso pra eles enxergar qualquer coisa mais luminosa que aquelas sombras.
Um médico, no entanto, angustiado por sentir lá no fundo que medicina não era aquilo, percebeu os grilhões que o aprisionava. Resolveu comentar com os colegas: “Vejam! Há grilhões em nossas mãos e pés!” Os outros, prontamente, responderam: “Ta louco? Faz silêncio se não vou perder a próxima sombra!”
Apesar de rechaçado pelos colegas, o médico inquieto e perspicaz conseguiu livrar-se dos grilhões e virar-se, percebendo que atrás de si havia uma fogueira. Seus olhos doeram bastante quando se virou, mas conseguiu com o tempo se acostumar com a luminosidade.
Percebeu então que os catedráticos projetavam as sombras que ele vira durante toda a vida. Foi rispidamente questionado porque havia se levantado e se livrado dos grilhões e mandaram-no voltar ao seu lugar, dizendo que ele estava louco de pensar que havia algo a mais que as sombras, mas, apesar disso, apesar da pressão daqueles que sempre respeitou, sabia que a medicina não podia se resumir àquilo e foi quando avistou ao longe uma luminosidade mais forte até que a fogueira que formava as sombras.
Conseguiu, então, fugir da caverna e chegar ao lado de fora. Percebeu que muito maior que as sombras na parede, maior que a fogueira dos catedráticos, era o Sol da verdadeira Medicina Hipocrática, que só brilhava fora das paredes da caverna.
Doeu bastante até que seus olhos se acostumassem com a luminosidade dela; questionou-se porque tantos outros negavam-se a ver que as coisas iam além das sombras, além do diagnóstico e tratamento; vacilou a princípio por se achar um pouco só, mas sentiu em seu íntimo que aquele era seu caminho, ali sim ele poderia ser um verdadeiro Médico, não um mero prescritor de remédios e exames, alimentado por muito mais que sombras (slides?) na parede...
P.S.: qualquer semelhança com outra história é mera coincidência...
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